Artigo: Pedagogia, alfabetização e letramento nas escolas brasileiras, evolução histórica

Artigo: Pedagogia, alfabetização e letramento nas escolas brasileiras, evolução histórica

Olá! Como vai você?

Neste artigo, falamos sobre como a gente precisa se aprofundar na história da alfabetização e do letramento no Brasil para criar estratégias de aprendizagem para o presente e o futuro. Este é mais um artigo de uma série de textos que elaborei no meu doutorado na Johns Hopkins University. Aproveite a leitura!

Pontos principais
Pais: conhecendo a história do ensino de leitura e escrita podemos conversar melhor com as professoras sobre o aprendizado de nossos filhos.
Gestores: milhões de estudantes brasileiros abandonam as escolas ou não estudam pois dizem que as aulas são “desinteressantes”. Entender como chegamos na educação atual pode nos ajudar a traçar estratégias didáticas mais atrativas, cativando os alunos.
Professores: a escola deve compreender quais os fatores têm maior influência sobre a motivação e o engajamento dos estudantes e das famílias e, assim, trabalhar para diminuir a evasão.

Desafios da educação no Brasil

A educação básica do Brasil está em uma situação complicada. A maioria das crianças não aprende o mínimo desejável, colocando o país entre os de menor desempenho em avaliações internacionais [1]. Além disso, a taxa de evasão escolar é de 25%, a terceira maior do mundo. Milhões de estudantes abandonam nossas escolas todos os anos reclamando de que a educação fornecida é desinteressante [3].

De acordo com avaliações nacionais [2]:

  • 66% dos alunos terminam o 9º ano sem aprender o mínimo necessário em portugês;
  • 85% dos alunos terminam  o 9º ano sem aprender o mínimo esperado em matemática.

Esse problema se estende até o ensino superior, onde estimativas indicam que 50% dos estudantes são analfabetos funcionais [4].

Sem aprender a ler e escrever bem desde cedo, uma criança jamais irá dominar as outras áreas do conhecimento. Por isso, precisamos nos aprofundar sobre os desafios da alfabetização no Brasil. Esta análise histórica busca determinar os fatos e processos que nos levaram a esse baixo aproveitamento dos alunos no ensino fundamental e no ensino médio.

Uma breve história sobre a alfabetização no Brasil

Os primeiros registros sobre a educação brasileira datam de 1554, a época dos jesuítas e do período colonial. Em 1759, quando os padres foram expulsos do país, suas escolas tinham matriculado menos de 0,1% da população [5]. As primeiras tentativas de organizar a educação do país começaram em 1876 e coincidiram com os movimentos pela formação da República. Esse período foi marcado pela implementação dos primeiros métodos de ensino de leitura, com base em abordagens sintéticas como o método alfabético [6].

A segunda fase da alfabetização no Brasil começou em São Paulo depois de 1890, com professores que defendiam a importância da pedagogia (o “como” se ensina) e dos métodos analíticos. Essa visão moderna gerou uma disputa acirrada entre esse grupo e os adeptos das abordagens mais tradicionais (sintéticas) [6]. O termo “alfabetização” foi criado mas o foco permaneceu em ensinar os alunos a ler, a escrita ainda estava muito ligada à caligrafia [6].

A terceira fase da alfabetização começou por volta de 1920, quando os professores começaram a rejeitar abertamente os métodos analíticos que se tornaram obrigatórios na segunda fase [6]. Foi nesse período em que nasceram os métodos mistos e os testes ABC para medir o desempenho dos alunos [7].

No entanto, uma das mudanças mais fortes foi que a pedagogia ficou cada vez mais dependente dos aspectos psicológicos (“para quem ensinamos”). Esse embate entre os diferentes métodos, a mistura entre “antigo e novo” e a sensação de fragilidade são questões importantes que podem ter influência nos níveis atuais de desempenho dos alunos.

Com início em 1980, a quarta fase da alfabetização brasileira foi marcada por mudanças sociais e políticas que resultaram na restauração da democracia [6]. Nesse período, surgiu o construtivismo, um paradigma muito diferente da tradição behaviorista.

A desvantagem da difusão da perspectiva construtiva foi que ainda não havia um método de ensino-aprendizagem estruturado A ausência de um método estruturado ainda está presente em nossas escolas [8] e deve ser um dos fatores que causa o baixo desempenho dos estudantes de hoje.

Na década de 1990, o sistema educacional brasileiro cresceu e se tornou cada vez mais universalizado. A intenção era permitir que o Brasil fosse competitivo em um contexto globalizado e digital.

O acesso à escola em todos os níveis de educação aumentou consideravelmente, e o país pôde dizer com orgulho que quase todas as crianças já estavam na escola. Apesar de termos conseguido matricular praticamente todas elas, passamos a notar que não estavam aprendendo o suficiente. Essa conjuntura é bastante parecida com a situação atual de nossas escolas [5].

Leia mais

Artigo: Desenvolvimento cognitivo, Vygotsky e o aprendizado na alfabetização.

A formação de professores(as) brasileiros(as) e a alfabetização

Para entender a realidade dos educadores, é preciso ter uma visão geral de como o país trabalhou para fornecer uma formação para esses profissionais desde a primeira escola para professores, fundada em 1684 [9]. Num certo momento, essa formação foi “dividida” em duas visões.

De um lado, um modelo mais conteudista, que dá preferência à bagagem cultural do(a) futuro educador(a) e aos conhecimentos específicos da disciplina que escolheu (português, matemática, ciências, etc). De outro lado existe um modelo pedagógico, que valoriza as estratégias de ensino em si. As universidades brasileiras, no decorrer da história, focaram mais no conteúdo e deixaram em segundo plano o “como ensinar”.

Uma abordagem interessante que pode ser utilizada para unir o conteúdo e as abordagens pedagógicas na formação superior dos professores pode tomar como ponto de partida os materiais didáticos usados ​​nas escolas [10].

Os materiais didáticos, como os livros didáticos tradicionais e as novas tecnologias que estão sendo difundidas nas escolas, podem ser aliados à formação docente. Analisando os aspectos pedagógicos desses textos, os(as) graduandos(as) poderiam relembrar o que já haviam aprendido nas outras disciplinas da graduação (o conteúdo) e, ao mesmo tempo, discutir formas de aplicar diferentes estratégias pedagógicas no dia-a-dia enquanto professores(as).

Livros didáticos para alfabetização

Analisando a evolução dos livros didáticos voltados ao ensino de leitura para crianças, podemos aprender muito sobre a situação atual de nossas escolas. A partir de 1890 surgiram as cartilhas, que foram cada vez mais utilizadas e logo se tornaram fundamentais para a disseminação dos diferentes métodos de ensino propostos no decorrer do tempo [11].

As cartilhas também serviram para moldar o conteúdo que deveria ser ensinado e, no final, estabeleceram conceitos importantes sobre aprendizado de leitura e escrita, cujos objetivos e utilidades passaram a fazer parte das escolas [11]. Análises dos livros didáticos mais recentes indicam que eles ainda apresentam algumas das características das cartilhas originais [11].

Esse é um ponto importante para a alfabetização: se os livros didáticos são um componente-chave do arsenal de ferramentas dos professores, eles podem ser uma das causas ou parte da solução dos baixos índices no aprendizado de leitura e escrita nas escolas brasileiras.

A evolução dos métodos de alfabetização

Diferentes propostas pedagógicas para o ensino de leitura e escrita foram introduzidas ao longo das décadas [12]. Em cada época, diferentes grupos surgem com suas próprias visões sociais e políticas, cada um deles oferecendo uma versão do que seria a solução perfeita para o problema do baixo desempenho das escolas brasileiras.

Quando um grupo assim surge, ele geralmente defende um método de ensino revolucionário, baseado nas “mais recentes descobertas científicas”. Conceitos como “antigos” e “tradicionais” passam a ser usados para atacar as propostas anteriores, que são colocadas como frágeis em relação aos novos métodos – esses sim inovadores e cheios de vantagens.

Definindo alfabetização e letramento

A palavra “letramento” foi introduzida por volta de 1980 no Brasil, na França (illettrisme) e em Portugal (literacia) para definir práticas sociais de leitura e escrita que decorrem do processo de aprendizagem da leitura e escrita [8].

Letramento é “um estado ou condição que um grupo social ou um indivíduo adquire como consequência de ter dominado a escrita e suas práticas sociais” [13] (p. 4). Esse termo contrasta fortemente com alfabetização, que significa ter aprendido a ler e a escrever.

Resumindo, letrado é alguém que aprendeu a ler e escrever (alfabetizado) e usa essas habilidades para se envolver em atividades que o integram à sociedade. Isso inclui ler diversos tipos de textos, desde notícias simples a romances complexos, escrever bilhetes simples, uma carta, um ensaio ou até mesmo uma dissertação.

O construto letramento é interessante para se analisar o problema do baixo nível de aprendizado de leitura e escrita nas escolas brasileiras. As pesquisas no Brasil podem estar dizendo que uma certa parcela da população não é alfabetizada, mas na realidade avaliando se essas pessoas são letradas. Assim, precisamos definir qual é o objetivo real das nossas escolas. Queremos alfabetizar? Alfabetizar e letrar?

Outro aspecto importante é que, com a revolução digital (ex: smartphones, apps e mídias sociais), o uso da linguagem escrita está aumentando dramaticamente para as classes de renda mais baixa. Isso é importante porque permite que elas leiam e participem mais das  práticas letradas, mas traz alguns desafios – principalmente em relação às suas imagens pessoais e profissionais, quando cometem erros de compreensão e grafia.

Aparentemente, o objetivo do sistema educacional brasileiro deve ser ensinar aos alunos a ler e escrever (alfabetização) e garantir que façam o uso social dessas habilidades (letramento). É necessário trabalharmos para que estas duas habilidades sejam atingidas por todos os estudantes.

Referências

[1] OECD. (2012). Programme For International Student Assessment (PISA). Retrieved from http://www.oecd.org/education/PISA-2012-results-brazil.pdf

[2] Qedu. (2015). Aprendizado dos alunos: Brasil. Retrieved from http://goo.gl/R6BX3w

[3] Neri, M. (2009). Motivos da evasão escolar. Brasília: Fundação Getulio Vargas.

[4] Globo. (2012, November 26). DFTV 2ª Edição. Brasília, DF: Rede Globo. Retrieved from http://goo.gl/8n6ACD

[5] Marcílio, M. L. (2005). História da escola em São Paulo e no Brasil. São Paulo, SP: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo / Instituto Fernand Braudel.

[6] Mortatti, M. D. R. L. (2006). História dos métodos de alfabetização no Brasil. Portal Mec Seminário Alfabetização e Letramento Em Debate.

[7] Monarcha, C. (2008). “Testes ABC”: origem e desenvolvimento. Boletim-Academia Paulista de Psicologia, 28, 7-17.

[8] Soares, M. (2004). Letramento e alfabetização: as muitas facetas. Revista Brasileira de Educação, 25, 5-17.

[9] Tanuri, L. M. (2000). História da formação de professores. Revista Brasileira de Educação, 14, 61-88. Retrieved from: http://www.scielo.br/pdf/rbedu/n14/n14a05

[10] Saviani, D. (2009). Formação de professores: aspectos históricos e teóricos do problema no contexto brasileiro. Revista brasileira de Educação, 40, 143.

[11] Mortatti, M. D. R. L. (2000). Cartilha de alfabetização e cultura escolar: um pacto secular. Caderno Cedes, 52, 41-54.

[12] Mortatti, M. D. R. L. (2009). A “querela dos métodos” de alfabetização no Brasil: contribuições para metodizar o debate. Acolhendo a alfabetização nos países de língua portuguesa, 3, 91-114.

[13] Soares, M. (1998). O que é letramento e alfabetização. Letramento: um tema em três gêneros. Belo Horizonte: Autêntica.




Artigo: Desenvolvimento cognitivo, Vygotsky e o aprendizado na alfabetização.

Artigo: Desenvolvimento cognitivo, Vygotsky e o aprendizado na alfabetização.

Olá, pessoal, tudo bem?

Hoje, a gente traz mais um artigo cheio de insights e com diferentes perspectivas sobre o crescimento e o aprendizado. Ele também faz parte de uma série de textos que produzi no meu doutorado na Johns Hopkins University. Boa leitura!

Pontos principais
Pais: proponham sempre novos desafios para que sua criança adquira novas habilidades.
Gestores: é importante que os gestores tenham informações atualizadas e claras sobre como está o desenvolvimento de cada uma das suas turmas, nos objetivos de aprendizagem da BNCC.
Professores: identificar as habilidades que os alunos já possuem e sempre propor novos desafios para que eles possam desenvolver novas experiências e conhecimentos

Uma visão geral da Teoria Cognitiva

As teorias cognitivas surgiram quando os pesquisadores behavioristas passaram a ter problemas por não conseguirem explicar todas as ações dos humanos, que são seres complexos [1]. A perspectiva cognitiva entende que os humanos não são apenas entidades que respondem ao ambiente (visão behaviorista). Para as teorias cognitivas, nós humanos agimos para atingir nossos objetivos e, para isso, buscamos informações ativamente.

A visão da ação cognitiva também se aplica a crianças, e as entende como aprendizes que são capazes de definir seus objetivos, planejar suas ações e revisar seus conhecimentos. Ou seja, as crianças criam buscam e organizam seus conhecimentos e artefatos.

Dentro desta perspectiva, o comportamento humano não é atribuído a causas internas, como afirma a teoria psicodinâmica e de traços. As pessoas são movidas por estímulos ambientais, fatores pessoais e fatores comportamentais. Nossas ações surgem a partir da interação entre estes três tipos de estímulos, sintetizados no modelo que foi chamado pelo pesquisador Albert Bandura de reciprocidade triádica.

Várias abordagens teóricas foram desenvolvidas com base na perspectiva cognitiva para explicar e prever o comportamento humano e a aprendizagem. As teorias de processamento de informações são bons exemplos.

Teorias cognitivas

Para explicar como as pessoas aprendem, as teorias cognitivas usam conceitos como atenção, percepção, memória de curto e longo prazo, modelo de memória de dois armazenamentos, níveis de profundidade de processamento e nível de ativação [3].

Uma parte importante do aprendizado é a capacidade do indivíduo de monitorar seus esforços cognitivos, incluindo memória e compreensão. Tais habilidades afetam como ele conduz suas ações para completar seus objetivos, com base no conhecimento metacognitivo (aprender sobre como ele aprende) e experiências anteriores [4].

Conhecimento já adquirido e experiências prévias também influenciam a capacidade de resolução de problemas do estudante. Nesse sentido, crianças que vivenciaram mais experiências e já acumularam uma base maior de conhecimento tendem a ter uma maior capacidade para resolver problemas do que outras da mesma idade, por estar em uma zona de desenvolvimento proximal diferente [5].

Leia mais

30 milhões de palavras! A diferença entre crianças que escrevem bem e as que enfrentam dificuldades

A zona de desenvolvimento proximal de Lev Vygotsky

A zona de desenvolvimento proximal é um conceito interessante para o estudo das habilidades de leitura e escrita. Nela, o educador precisa descobrir a capacidade atual do aluno (por exemplo, ler palavra por palavra) e então supor os níveis mais altos de tarefas que ele conseguirá realizar sob orientação (por exemplo, ler pequenas frases). Essa é a zona de desenvolvimento proximal, a faixa de atividades que podem ser feitas e que serão úteis para o estudante para avançar no aprendizado [6].

Assim, os designers instrucionais, os (as) educadores (as) que criam jogos didáticos, currículos e sequências didáticas devem ter como objetivo permitir que o aluno alcance os níveis superiores da sua zona de desenvolvimento proximal, para que, sob orientação, cumpra as tarefas mais desafiadoras de que é capaz. “À medida que uma nova habilidade ou conceito é dominado, o que uma criança um dia pode fazer apenas com assistência, logo se torna seu nível de desempenho independente” [7].

Quando isso acontece, significa que a zona de desenvolvimento proximal da criança se deslocou para cima e, nesse caso, o processo é reiniciado com o (a) professor(a) propondo um desafio mais alto para que a criança se esforce e avance para o seu próximo nível.

Esse processo ocorre desde cedo, quando os (as) cuidadores (as) “direcionam a atenção das crianças para pontos críticos dos acontecimentos, comentam sobre aspectos que devem ser observados pelas crianças” e, de maneira geral, ajudam as crianças a estruturar e compreender as informações que estão recebendo do ambiente que as rodeia [1].

É importante notar que o desenvolvimento do aluno não deve depender apenas do que o (a) professor (a) determina. O aluno deve se tornar capaz de liderar seu aprendizado.

Por isso, é essencial incentivar as habilidades metacognitivas em que o estudante começa a refletir sobre o que ele faz para aprender e os resultados que está obtendo. Aprender a aprender é um processo muito importante, que deve ser estimulado pelos professores (as) e famílias [1].

Teorias cognitivas na alfabetização

Infelizmente, a maioria dos estudantes das escolas brasileiras não atinge as metas de aprendizado de leitura e escrita até o 3º ano (período oficial da alfabetização). A perspectiva cognitiva pode fornecer informações valiosas para entender e atuar sobre esse problema. Usando o conceito de zona de desenvolvimento proximal, podemos dividir esse desafio em dois momentos.

O primeiro deles é a zona de desenvolvimento proximal das crianças antes de entrar na escola, desenvolvida nos primeiros anos por suas interações com familiares e cuidadores. Esse é um conceito importante para a avaliação do aproveitamento do aluno na alfabetização porque se relaciona diretamente com a zona de desenvolvimento proximal em potencial no final da terceira série.

Se o aluno entrar na escola com fortes habilidades linguísticas (por exemplo, vocabulário amplo), ele provavelmente vai atingir as metas de aprendizado. Uma prática interessante que pais, cuidadores e educadores de creches podem implementar para fortalecer a zona de desenvolvimento proximal crianças é chamada de escrita assistida (scaffolded writing).

Na escrita assistida, as crianças são orientadas a pensar e planejar o que irão escrever, depois desenham e só então escrevem. A etapa final pode ocorrer com vários tipos de escrita, como na escrita espontânea. Esta prática foi avaliada em diversas pesquisas como bastante efetiva no desenvolvimento da capacidade de leitura e escrita.

No entanto, os estudantes que chegam a escola com uma zona de desenvolvimento proximal menos desenvolvida terão que passar por um processo de aprendizado mais intensivo, a fim de alcançar as metas de aprendizado até a terceira série. Isso provavelmente envolverá vários ciclos de aprendizado para elevar a sua zona de desenvolvimento até um nível similar a dos alunos que já entraram na escola com habilidades mais desenvolvidas e mais experiências prévias.

Próximos passos

A partir dos conceitos citados, podemos argumentar que o (a) professor (a) precisa descobrir a zona de desenvolvimento proximal de seus alunos logo no começo das aulas. Se um aluno exibir um desenvolvimento abaixo do esperado, o (a) professor (a) terá que criar uma sequência de desenvolvimento específica para esse aluno.

Para alcançar o sucesso, essa trajetória de aprendizado pode exigir diferentes estratégias, incluindo algumas táticas metacognitivas, como parafrasear os outros e ensaiar o que irá falar [3]. No entanto, nas escolas do mundo real, os (as) educadores (as) enfrentam múltiplos desafios.

Embora muitas práticas e sugestões oferecidas pelas abordagens cognitivas possam auxiliar estudantes e professores (as), muitas delas não são fáceis de implementar. Na maioria das vezes, pelo menos no Brasil, um professor tem que trabalhar com 15, 20 e até 30 alunos em uma aula, sem assistente.

Se considerarmos a educação tradicional [8], em que uma sala de aula padrão é composta de cadeiras, mesas, quadro negro e o professor, pode-se argumentar que oferecer uma educação personalizada é um desafio colossal, provavelmente impossível.

No entanto, é importante notar que não apenas estudantes e adultos podem servir como assistentes. Os celulares e tablets também podem ajudar a desenvolver a zona de desenvolvimento proximal usando aplicativos especialmente desenvolvidos para esses empreendimentos.

As práticas metacognitivas orientaram o desenvolvimento de alguns desses aplicativos, ajudando o aluno a compreender seus próprios passos no processo de aprendizagem, promovendo a autonomia.

Associadas a técnicas avaliativas, tais abordagens podem proporcionar experiências metacognitivas que impulsionam a motivação e a autoeficácia. Há casos em que o uso de aplicativos para auxiliar os alunos dentro de sua zona de desenvolvimento proximal, com estratégias metacognitivas, foi capaz de fortalecer a leitura e a escrita [9].

Outro exemplo de tecnologia de sucesso no processo de aprendizado de leitura e escrita é o aplicativo Escribo Play. Em uma pesquisa experimental de grande porte (disponível aqui), com 749 crianças, foi identificado que as turmas que utilizam os jogos deste aplicativo fortalecem o aprendizado de leitura em 68% e o de escrita em 48%.

Referências

[1] Bransford, J. D., Brown, A. L., & Cocking, R. R. (1999). How people learn: Brain, mind, experience, and school. National Academy Press.

[2] Bandura, A. (1986). Social foundations of thought and action: A social cognitive theory. Prentice-Hall.

[3] Schunk, D. H. (2012). Information processing system. In Learning theories: An educational perspective. Upper Saddle River, NJ: Pearson.

[4] Flavell, J. H. (1979). Metacognition and cognitive monitoring: A new area of cognitive–developmental inquiry. American psychologist, 34(10), 906.

[5] Vygotsky, L., Hanfmann, E., & Vakar, G. (2012). Thought and language. MIT press.

[6] Moll, L. C. (2014). LS Vygotsky and education. Routledge.

[7] Leong, D. (1998). Scaffolding emergent writing in the zone of proximal development. Literacy, 3(2), 1.

[8] Freire, P. (2000). Pedagogy of the oppressed. Bloomsbury Publishing.

[9] Salomon, G., Globerson, T., & Guterman, E. (1989). The computer as a zone of proximal development: Internalizing reading-related metacognitions from a Reading Partner. JournalofEducationalPsychology, 81(4), 620.


Jogos de simulação melhoram a aprendizagem de ciências

Jogos de simulação melhoram a aprendizagem de ciências

Aqui na Escribo, nós nunca duvidamos do potencial das crianças. Uma pesquisa que ainda vai ser publicada identificou que crianças de cinco anos que usaram jogos de simulação nas aulas aprenderam conceitos de ciência com mais facilidade.

Pontos principais

Pais: jogos de simulação podem ajudar seu filho a desenvolver o senso crítico, a capacidade de observar, a seguir etapas e o processo de experimentação.

Gestores: as famílias valorizam atividades educativas que despertem a criatividade e trabalhem o conhecimento na prática, como as que são feitas nos simuladores. Eles ajudam a dar visibilidade para a educação inovadora da escola.

Professores: com os aplicativos educativos de simulação, as crianças tiveram mais facilidade para tirar dúvidas, fazer sugestões e aprender o conhecimento científico. Portanto, essa aprendizagem significativa tende a fortalecer o interesse, o foco e a curiosidade dos estudantes.

O objetivo do estudo era entender de que formas os simuladores poderiam fortalecer o aprendizado do conhecimento científico. Além disso, os pesquisadores também queriam saber se os simuladores estimulavam habilidades importantes como a capacidade de reflexão e o domínio de conceitos abstratos.

Como foi feita a pesquisa

Três professoras acompanharam 38 crianças durante quatro semanas. Em pares, as crianças se divertiram com jogos de simulação que propunham desafios sobre circuitos elétricos (ex: em série, paralelos, correntes e resistência).

Além do desempenho nas tarefas, o estudo também considerou os comentários feitos pelas crianças sobre as atividades propostas – se elas gastavam mais tempo descrevendo o que faziam, refletindo sobre a tarefa ou fazendo experiências e exercitando a criatividade.

Leia mais
Tecnologia e ensino de qualidade precisam andar juntos, segundo pesquisa

Principais resultados

Os pesquisadores descobriram que as crianças aprenderam com mais facilidade porque puderam observar, experimentar na prática e refletir sobre as similaridades e diferenças entre as várias tarefas que foram desenvolvidas nos simuladores. Para saber mais, acesse o artigo científico.

Esta pesquisa é importante porque demonstra como os jogos e simuladores fortalecem o aprendizado. Ao mostrar que as crianças observam, experimentam e refletem sobre o que fazem dentro dos jogos, a pesquisa desconstrói a ideia de que as crianças, ao jogar, apenas praticam o simples “erro e acerto”.

Ou seja, o feedback que é oferecido pelos jogos de simulação é capaz de desencadear processos metacognitivos. Em outras palavras, o estudante progressivamente torna-se mais capaz de entender como ele próprio aprende, ganhando autonomia para liderar o seu próprio desenvolvimento.

Aqui no blog da Escribo sempre publicamos conteúdos relevantes sobre inovações educacionais. Então, não deixe de nos acompanhar!

Até a próxima!


Escribo entre as 20 mais inovadoras da América

Matéria de capa do caderno de economia do UOL/Jornal do Commércio sobre a premiação do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) para as melhores startups da América Latina. Leia o sumário da matéria abaixo ou o texto completo.


“A empresa pernambucana Escribo ficou como finalista entre as 20 startups mais inovadoras da América no concurso Economia Naranja realizado pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) na qual participaram 521 iniciativas de vários países da América Latina e Caribe. A companhia pernambucana concorreu com o Projeto Frei.re, uma plataforma digital que permite aos professores e alunos criarem os seus próprios jogos digitais e compartilharem, por exemplo, com outros alunos.

“O professor que utilizar a plataforma pode trocar o fundo do jogo, colocar as fotos dos alunos nos personagens dos joguinhos e fazer jogos sobre temas como Carnaval, times de futebol, além de construir outros jogos com um conteúdo pedagógico próprio”, explica o diretor executivo da Escribo, Américo Amorim. Na prática, quando as alterações feitas pelo professor estiverem prontas, será gerado um link próprio. É esse link que será acessado pelos alunos, podendo ser usado apenas por uma sala ou por todas, dependendo do professor.

O conteúdo disponibilizado no Frei.re é voltado para os alunos de quatro a dez anos de idade, quando as crianças frequentam o 5º ano do fundamental. “Nos voltamos para a educação infantil porque percebemos uma demanda”, conta.

A plataforma também disponibiliza aos professores ferramentas que podem identificar se o jogo está fácil ou difícil para a classe, se os alunos estão aprendendo e qual a etapa do jogo que os estudantes não estão conseguindo ultrapassar. E Américo acrescenta: “quando uma grande quantidade de alunos não consegue passar de determinada etapa, ou é um problema do jogo ou do aprendizado”.

O desenvolvimento dela foi iniciado em novembro do ano passado baseada em pesquisas desenvolvidas por Americo, que cursa o doutorado na Johns Hopkins, a melhor pós-graduação em educação dos EUA.

A Escribo passou a atuar no mercado de livros digitais em 2014. Hoje, a empresa vem se especializando em educação, fornecendo conteúdo digital para grandes grupos educacionais como a FTD, Moderna, Saraiva e a Somos Educação.

30 milhões de palavras! A diferença entre crianças que escrevem bem e as que enfrentam dificuldades

Olá pessoal, tudo bem?

Nesse último final de semana eu recebi a visita de um grande amigo meu que fez doutorado em Oxford. Um cara super inteligente. Ele mora em Brasília e me contou que um colega dele está com um problema com o filho. A criança tem 4 anos e até agora não consegue se comunicar bem. Não fala, e tem problemas de socialização na escola.

O que ele me contou foi que os pais dessa criança também tem um comportamento um pouco diferente. Não se comunicam muito com o filho. Eu comentei com ele de um estudo que li durante o doutorado sobre uma pesquisa de grande porte feita nos Estados Unidos a respeito de como funciona a aquisição da linguagem nas crianças e resolvi fazer um vídeo explicando um pouco melhor sobre ela Abaixo você pode conferir a transcrição completa dele.

Essa pesquisa foi feita por Betty Hart & Toddy R. Risley, dois estudiosos que focavam em intervenções para melhorar o trabalho dentro de sala de aula. Eles fizeram uma série de estudos e o ganho que eles tinham de aprendizado com as crianças na pré-escola (educação infantil) era muito pequeno. Eles passaram então a investigar o que podia ser feito além da sala de aula, para facilitar a alfabetização das crianças.

Eles foram então acompanhar a vida de 42 famílias: 13 famílias de alta renda, 10 famílias de classe média e 19 famílias de classe mais baixa. Os pesquisadores passaram um mês dentro da casa dessas pessoas acompanhando crianças de 7 meses até três anos de idade. Eles registravam tudo o que acontecia com gravadores de som e depois levavam para analise no laboratório.

O estudo – que levou vários anos para ser feito – foi publicado em 2003 e os pesquisadores identificaram alguns dados bem interessantes. Por exemplo, na análise que foi feita dessas gravações, das centenas de horas de diálogos entre os pais e as crianças tanto em casa ou quando saíam pra fazer alguma atividade, eles descobriram que de 86 a 98% da palavras que eram usadas pelas crianças aos três anos de idade eram palavras que eram faladas pelos pais.

Eles também descobriram que a duração das falas e o padrão do que era falado pelas crianças também era exatamente igual ou muito parecido com o que aqueles pais falavam. Mas o principal ponto da pesquisa foi a descoberta de que em famílias de alta renda cada criança escutava, recebia através do relacionamento com as pessoas que estavam ao redor dela, com os pais, avós ou pessoas que trabalhavam naquela casa cerca de 2153 palavras por hora.

As crianças da classe média, por sua vez, escutavam 1251 palavras por hora ou seja 1.000 palavras a menos. E nas famílias mais pobres as crianças só escutavam 616 palavras por hora. Eles resolveram então investigar além da quantidade de palavras que essas famílias falavam com as crianças o conteúdo do que era dito.

Uma das variáveis que eles observaram foi o nível de incentivo e o de repreensão que esses pais tinham com as crianças, ou seja, se quando a criança fazia alguma atividade o pai incentivava, apoiava  ou se o reclamava, repreendia aquela criança para não fazer mais aquilo.

Foi quando identificaram outra relação interessante. Em famílias de alta renda para cada seis incentivos que a criança recebia, ela sofria uma repreensão. Ou seja, ela fazia seis coisas que os pais achavam interessante e incentivavam, para cada uma besteira em que o pai dizia “não, não faça isso”.  Na classe média ao invés de 6 para 1 essa relação caiu de 2 incentivos para uma repressão, ou seja, a criança ainda fazia duas vezes mais coisas bacanas para os pais do que coisas que os eles repreendiam.

O contraste total foi na classe mais baixa. Nas famílias mais pobres as crianças recebiam em média duas reclamações para cada incentivo. De modo que na classe alta as crianças eram muito incentivadas a fazer suas atividades, muito encorajadas; na classe média esse encorajamento era um pouco menor, mas ainda positivo (dois incentivos para cada reclamação) e na classe baixa basicamente o que os pais mais faziam era reclamar com as crianças, com duas reclamações para cada incentivo.

A conclusão final do estudo foi que as habilidades que uma criança tem em linguagem aos 3 anos indicam estatisticamente as habilidades que que essa criança vai ter lá na frente aos 9, 10 anos. Ou seja, na educação infantil se uma criança com dois ou três anos tiver um bom vocabulário e facilidade em comunicação, ela tende a a ter notas melhores em português, literatura e redação no futuro.

O grande segredo revelado pela pesquisa foi que a escola sozinha não vai conseguir formar leitores e escritores. Os pais precisam ajudar na formação dos leitores dos jovens escritores desde que  a criança nasce.

Então ali na barriga da mãe já é importante que a família já fale com o bebê. E assim que a criança nascer sempre falar muito com ela, mesmo que ela não responda. Você fala e dá um tempo pra que ela possa responder. No começo ela não vai responder porque não sabe fazer sons, não sabe falar, mas ela já vai esboçar reações e se acostumar com o fluxo do diálogo: alguém fala ela, ela responde, alguém fala ela responde.E a medida que a criança for ficando maior incentivá-la a falar e a fazer suas atividades.

Então esse estudo, concluindo, observou que que existia uma diferença de 30 milhões de palavras entre as crianças de 0 a 3 anos de famílias mais ricas e as crianças de famílias mais pobres. E é essa diferença nessa faixa etária que determina em grande medida o sucesso daquele aluno na escola no futuro.

Nesse sentido, nós como educadores, precisamos incentivar as mães e os pais das crianças da educação infantil a conversar bastante com seus filhos, o máximo possível. E dentro de sala de sala de aula temos que desenvolver atividades para crianças de 1, 2 e 3 anos que foquem o máximo possível em conversação, incentivando-as a falar e se expressar. Quanto mais atividades nesse sentido forem desenvolvidas melhor vai ser o vocabulário dela e maior sua performance futura na alfabetização e  séries posteriores.

Por hoje é só e até a próxima!