Timothy Shanahan: já sou um(a) ótimo(a) professor(a), por que deveria seguir evidências científicas?

Timothy Shanahan: já sou um(a) ótimo(a) professor(a), por que deveria seguir evidências científicas?

Um professor me perguntou: “o que significa dizer que algo tem base em evidências científicas? Sou professor há anos e já ensinei centenas de crianças a ler. Agora me disseram que em nosso estado devemos ensinar com base em evidências de pesquisas. Gosto de ensinar e não quero mudar meu estilo. Por que deveria?”

Eu imagino que muitos professores concordam com ele. Um pesquisador como eu pode recomendar esta ou aquela abordagem de ensino como ideal. Porém, muitos(as) professores(as) veem o aprendizado de seus alunos progredindo bem sem esse método visto como indispensável pelos cientistas.

Por que confiar em um pesquisador que nem conhece esses(as) alunos(as), quando você pode confiar em seus próprios olhos?

O que funciona pra uns pode não funcionar para outros

Primeiro, é importante saber o que queremos dizer quando afirmamos que a pesquisa mostra que uma abordagem de ensino “funciona”. Isso NÃO significa que somente essa abordagem funciona, mas quer dizer seus benefícios são um pouquinho maiores em relação aos de outros métodos.

O fato de haver alguma melhoria, mesmo que pequena, não significa que todas as crianças do grupo experimental prosperaram e que todas as crianças do grupo de comparação definharam. Simplesmente significa que a média de desempenho foi diferente para os dois grupos.

Você deve ter notado que usei o termo grupo de comparação em vez de grupo de controle. Normalmente, não temos “grupos de controle” nos estudos de leitura, pois seria antiético controlar ou limitar a alfabetização de qualquer pessoa. Todo método de ensino provavelmente vai ensinar algo, portanto sempre haverá aprendizado nos dois grupos.

Nesse caso, as crianças que fizeram tarefas de consciência fonológica superaram as que não tiveram essas habilidades estimuladas. Talvez, muitas das crianças ensinadas tenham se saído um pouco melhor que as crianças do grupo de comparação. Ou talvez, algumas crianças de cada grupo não tenham aprendido a ler, mas houve menos dessas falhas quando a consciência fonológica fazia parte das aulas.

Em todo caso, isso não quer dizer que as crianças do primeiro grupo aprendem e as do segundo grupo, não. Não é bem assim, no estilo “preto e branco” – está mais para tons de cinza. Essencialmente, por em prática os métodos de ensino que as pesquisas recomendam significa tentar alterar as probabilidades de sucesso dos(as) alunos(as).

Aproveite as oportunidades

Segundo, ao considerar se você deve seguir o que diz a pesquisa, entender o conceito de “custo de oportunidade” ajuda bastante.

Digamos que você ensina a ler há 10 anos e as crianças aprendem, as notas de provas e atividades são parecidas em média, as famílias estão felizes com sua maneira de ensinar e a direção da escola elogia seu trabalho como educador(a).

Obviamente, o seu jeito de ensinar está funcionando. Por que mexer em time que está ganhando, não é?

Essa até parece uma boa ideia, mas ela ignora o que chamei de custo de oportunidade. O fato de você alfabetizar de um certo jeito tirou de você a chance de ver como seria e quais resultados teria se ensinasse de outra maneira.

É aí que entra a pesquisa. Os(as) pesquisadores(as) tentarão organizar seus estudos de forma que seja possível avaliar como uma abordagem de ensino se compara a outra. E aí podemos ver que seus alunos poderiam inclusive aprender tanto quanto ou até mais se tivessem sido ensinados de outra maneira.

Em outras palavras, pode ser que não haja motivos para você ter uma abordagem pedagógica preferida. Nenhum(a) professor(a) pode saber o que suas crianças estão deixando de aprender por meio da abordagem atual, que parece tão satisfatória.

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As evidências científicas são indispensáveis

Terceiro, estou me referindo a pesquisas que se concentram em resultados específicos, na maioria das vezes nos ganhos de leitura mas também em outros resultados (por exemplo, interesse, motivação). Às vezes, pode parecer que os(as) professores(as) “negam a ciência” porque não reconhecem as descobertas reveladas pela pesquisa.

O(a) pesquisador(a) se preocupa em saber quantas palavras corretas por minuto as crianças podem ler, se elas podem decodificar uma lista de palavras sem significados ou quantas perguntas de múltipla escolha foram respondidas em uma avaliação. O professor pode ter outros critérios em mente.

Há alguns “casos” que sempre acontecem comigo. Quando mostro as provas de que um certo Método A obtém melhores resultados de aprendizado do que um Método B, sou inundado em mensagens de defensores de um Método B. Essas pessoas têm certeza de que, se eu visitasse a sala de aula delas, eu mudaria de idéia.

Esses(as) professores(as) não são burros(as), apenas têm objetivos diferentes dos adotados pelos pesquisadores.

Estou tentando fazer com que as crianças alcancem os níveis mais altos de aprendizado em leitura e escrita. Os(as) professores(as) também podem querer isso, mas podem valorizar ainda mais a sensação de poder ensinar de forma que eles (professores) se sintam em casa. É por isso que têm tanta certeza de que, se eu visse o quão boa é a sala de aula deles(as), eu escolheria a abordagem deles(as) e não a mais eficaz, em teoria.

Os(as) professores(as) costumam me dizer que precisam fazer tudo do jeito deles(as), porque estão ensinando “amor pela leitura”. Parece não incomodar a ninguém o fato de que não há uma referência de “amor pela leitura” no estado onde vivem, nenhum estímulo a esse “amor pela leitura” ou que esse “amor” depende muito do quão bem as crianças conseguem ler.

Podemos amontoar pesquisas e mais pesquisas aos pés desses(as) professores(as), mas essas pesquisas não se encaixam nas crenças e nos objetivos desses(as) educadores(as). Não importa quantas evidências nós mostremos, pessoas assim nunca serão convencidas.

Estimular o interesse pela pesquisa também é importante

Em conclusão, professores(as) geralmente sabem pouquíssimo sobre pesquisa – métodos de estudo, raciocínio, ética científica… Mesmo nas universidades de primeira linha, os estudantes dos cursos de educação têm pouco ou quase nenhum treinamento em pesquisa para professores e diretores. É difícil confiar em algo que você não entende.

Os(as) professores(as) muitas vezes duvidam de que “a pesquisa pode provar qualquer coisa”, revelando suas profundas suspeitas sobre a falta de confiabilidade tanto das evidências da(s) pesquisas quanto dos(as) pesquisadores(as).

Obviamente, os(as) pesquisadores(as) se preocupam bastante com esses problemas. É por isso que, por exemplo, a maior parte de nós não faz recomendações com base em apenas uma ou outra pesquisa, mas observando os resultados médios de diversas pesquisas para garantir a consistência das evidências descobertas.

Se um estudo diz que o “Programa de Leitura XYZ” gerou ótimos resultados, isso é uma coisa; mas se 38 ou 51 estudos reafirmam esse sucesso, então eu estou a bordo. Essa é a razão pela qual relatórios de diversos órgãos públicos dos Estados Unidos são tão úteis… é pouco provável que um estudo a mais atrapalhe esse sucesso, já que esses resultados se baseiam em muitas evidências. É nessa consistência que nós confiamos.

Quando o assunto é descoberta científica, outro benefício da abordagem metanalítica é que ela nos permite saber não apenas que uma abordagem funcionou – ou seja, que teve um efeito positivo no aprendizado – mas também entender o público com quem a abordagem funcionou e sob que circunstâncias ela deu certo.

Em muitas escolas, esse pensamento de “funcionar ou não” parece diminuir o nível de detalhe que os(as) professores(as) precisam para pôr em prática com sucesso os resultados das pesquisas – e justamente esses detalhes dariam aos professores maior confiança de que vale a pena seguir as pesquisas. Se 30 minutos por dia de ensino de fluência, por exemplo, podem melhorar essa habilidade, é necessário incluir esse ensino no planejamento. Mas se o(a) professor(a) não sabe o tempo de aula ou tipo de texto usado, o método pode falhar.

O(A) professor(a) que coloca as crianças para ler em voz alta uma página de texto fácil, para que pratiquem a fluência, está honrando a descoberta da pesquisa – o ensino de fluência é eficaz. Porém, não está seguindo as práticas pedagógicas específicas que levaram a essa descoberta.

Pouco a pouco, as crianças devem aprender muito com essa leitura, se o(a) professor(a) seguir a pesquisa. As evidências são a única ferramenta que temos para determinar quais métodos de ensino têm maior probabilidade de beneficiar o aprendizado de nossos alunos. O senso comum e a sabedoria acabam sendo são inúteis. É fácil para um(a) professor(a) deixar de buscar conquistas maiores para a turma se, para ele(a), “as crianças parecem ler bem”. Mas, atualmente, a tecnologia e as mudanças na maneira como trabalhamos e interagimos socialmente exigem níveis mais altos de alfabetização do que no passado. É importante prestar atenção nisso se os(as) estudantes precisam participar plenamente de nossa sociedade. Mais conhecimento sobre como a pesquisa é feita e como é avaliada ajudaria muito os(as) professores(as) a entender que essas informações podem realmente ajudá-los a serem cada vez melhores.

Espero que você consiga fazer as transformações necessárias na sua escola. Se bem feitas, elas podem levar a melhores resultados para todas as suas crianças.

Tradução: Danilo Aguiar /Américo Amorim.

Alfabetizar o adulto fortalece o aprendizado das crianças

Alfabetizar o adulto fortalece o aprendizado das crianças

O analfabetismo dificulta a vida de uma pessoa adulta em inúmeros aspectos – inclusive, o aprendizado de seus filhos e filhas. É sobre esse tema que conversamos com a professora Daphne Greenberg, pesquisadora educacional da Georgia State University e especialista no assunto.

Segundo a educadora, nos Estados Unidos, uma a cada seis pessoas adultas lê no mesmo nível de crianças da educação infantil. Isso revela o quanto ensinar uma pessoa a ler e escrever reflete no crescimento de um povo no decorrer de gerações. Buscar formas inovadoras e efetivas para a alfabetização é indispensável para mitigar o analfabetismo e melhorar esse cenário.

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Deixe sua opinião nos comentários, esse debate é interessante e muito necessário. Na próxima semana, nós retomamos o papo com a professora Greenberg sobre o tema. Toque no sininho ao lado e assine as notificações do Blog da Escribo para receber novos conteúdos assim que publicarmos. Até mais!

Robert Slavin: programas educativos de sucesso podem ser replicados sim!

Robert Slavin: programas educativos de sucesso podem ser replicados sim!

Na década de 1930, cientistas franceses anunciaram que de acordo com os princípios da aerodinâmica, as abelhas não podiam voar. As únicas evidências de que sim, elas podiam, eram os relatórios observacionais, que não seguiam padrões científicos e não tinham bases em teorias reais de que as abelhas voavam de fato. Enquanto eu conversava com algumas pessoas sobre a implementação em larga escala de programas educativos eficazes, essa história das abelhas, que é bem conhecida, surgiu na conversa.

Muitos pesquisadores educacionais e representantes políticos defendem que é falha a sequência “pesquisa, desenvolvimento, avaliação e implementação”, usada por décadas para descobrir as melhores maneiras de ensinar às crianças. Muitos analistas afirmam que poucos(as) educadores(as) recorrem às pesquisas para ajudar na escolha dos programas educativos mais indicados a melhorar o aprendizado dos(as) alunos(as) ou outros pontos importantes da educação.

Nas chamadas Research-Practice Partnerships (parcerias entre pesquisa e ensino), pesquisadores trabalham em parceria com educadores locais para resolver problemas importantes desses profissionais. As parcerias se baseam na ideia de que educadores quase nunca buscam ajuda em pesquisas – a menos que tenham sido parte da equipe de criação. Quem se opõe às políticas educacionais baseadas em evidências sempre reclama de que, como as escolas são muito diferentes entre si, é improvável que adotem projetos desenvolvidos em locais distantes, e é por isso que poucos programas educativos baseados em pesquisas são divulgados de forma ampla.

A implementação de programas eficazes é de fato difícil, e há poucas evidências de como eles podem ser melhor divulgados. Reconhecendo esses e muitos outros problemas, no entanto, é importante observar um pequeno fato nesse cenário triste: há programas que são divulgados sim. Há 113 iniciativas voltadas à leitura e ao ensino de matemática que atendem aos padrões rígidos da Evidence for ESSA, site que lista programas educativos adequados à Every Student Succeeds Act (ESSA), lei da educação dos Estados Unidos. Entre eles, a maioria foi implementada em dezenas, centenas ou até milhares de escolas.

Na verdade, não são aceitos os que não sejam implementados atualmente (porque não é muito útil para educadores, nosso público-alvo, descobrir que um programa educativo não está mais disponível – ou nunca esteve). Alguns desses, geralmente os mais recentes, podem operar apenas em algumas escolas mas devem crescer com o tempo. De qualquer forma,a maioria dos programas, desenvolvidos por organizações comerciais ou sem fins lucrativos, são amplamente divulgados.

Atualmente, há diversos programas de fortalecimento de matemática e da alfabetização voltados à educação infantil e aos anos iniciais do ensino fundamental. Todos eles, baseados em evidência científicas e de eficácia forte, moderada ou promissora, segundo os padrões das leis locais. Podemos citar, por exemplo, programas de leitura bem-sucedidos nos EUA como o Reading Recovery, Success for All e o Sound Partners; na matemática, têm resultados positivos o Math in Focus, Math Expressions e diversos outros. Entre os brasileiros, está o Escribo Play. Esses, eu já sei que têm resultados comprovados por evidências e são implementados. Podem haver outros menos conhecidos.

Espero que esta lista convença a todos os que duvidam de que programas comprovados podem ser implementados. À luz desta lista, por que tantos educadores, pesquisadores e representantes políticos resistem tanto a acreditar?

Um porquê pode ser o fato de que divulgar programas educativos quase nunca ocorre da maneira que os(as) pesquisadores(as) desejam. Eles(as) ficam desapontados(as) ao descobrir que publicar os resultados em periódicos e revistas científicas têm pouco impacto na prática, mesmo que invistam muitas horas e muita energia na pesquisa e na publicação de seus resultados. Geralmente, tentam deixar suas descobertas mais acessíveis usando uma linguagem mais simples em periódicos mais orientados à prática da profissão. Ainda assim, isso tem pouco ou quase nenhum impacto na divulgação.

Mas implementar um programa com eficácia não é somente escrever para periódicos. Na verdade, o(a) pesquisador(a) ou um(a) especialista (a), como uma editora ou empresa de inovação, precisa pegar as descobertas da pesquisa e transformá-las em um software ou aplicativo que resolva um problema importante para educadores(as), tenha atrativos, seja profissional, completo e não custe uma fortuna. Programas educacionais eficazes quase sempre contribuem para a formação dos professores, trazem materiais pedagógicos e apps ou software. Esses provavelmente serão implementados com amplo alcance. Acho que praticamente todos os programas listados acima surgiram como uma ótima idéia transformada em um programa atraente.

Uma parte triste desse processo é que os programas que não têm provas de eficácia, ou até mesmo ineficazes, seguem o mesmo processo de divulgação que os comprovados. Antes dos requisitos da ESSA surgirem em 2015, as evidências tinham um papel muito limitado. Até o momento, a ESSA “apontou os refletores” para os benefícios delas, mas também mostra que ter provas de eficácia não é um grande diferencial em relação aos programas que não têm. Muitos dos programas atuais afirmam que são “baseados” ou “informados por evidências”, então as pessoas podem ser enganadas.

No entanto, a situação está mudando. Primeiro, o próprio governo dos EUA está identificando programas com evidências de eficácia – e deve divulgá-los. Iniciativas governamentais, como o Investing in Innovation (hoje EIR), na verdade, fornecem financiamento a projetos de eficácia comprovada para que ampliem suas atividades. As iniciativas What Works Clearinghouse, Evidence for ESSA e outras fontes dão fácil acesso aos programas comprovados. Em outras palavras, o governo está começando a intervir para impulsionar a implementação em longo prazo de programas bem-sucedidos.

Agora, de volta às abelhas. A ideia de 1930 de que as abelhas não voavam foi derrubada em 2005, quando pesquisadores americanos descobriram o que as abelhas realmente fazem enquanto voam: elas não batem as asas como fazem os pássaros. Em vez disso, eles empurram o ar para frente e para trás com as asas, criando uma zona de baixa pressão acima delas. Essa pressão as mantêm no ar.

Da mesma forma, pesquisadores(as) educacionais podem parar de teorizar sobre como a divulgação/implementação de programas comprovados é “impossível” e, em vez disso, encontrar os que são realmente eficazes. Em seguida, podemos elaborar políticas governamentais para apoiar ainda mais os programas, aumentar a capacidade deles de se organizar e funcionar, bem como fornecer incentivos e assistência para ajudar as escolas que precisam deles a aprender a adotá-los.

Talvez possamos chamar isso de “plano bzz”.

Metanálise: revisitar o passado é essencial para inovar na educação do presente

Metanálise: revisitar o passado é essencial para inovar na educação do presente

Para a ciência, ainda é um mistério por que algumas pessoas aprendem facilmente a ler e outras, não. Esse é o objetivo das pesquisas de Arne Lervag, professor na Universidade de Oslo que estuda o desenvolvimento das habilidades de leitura. Neste vídeo, ele fala da importância de experimentos controlados e do uso da metanálise para ajudarmos a essas pessoas. 

Segundo o professor, as meta-análises cruzam e analisam dados educacionais já obtidos por diferentes métodos para revelar novas oportunidades de ações positivas nas escolas. O desafio é que a forma de inserir essas evidências no dia a dia dos(as) professores(as) pode variar a cada salas de aula. Cada caso é único!

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Timothy Shanahan: as diretrizes de leitura de Chicago

Timothy Shanahan: as diretrizes de leitura de Chicago

Nesta semana, o pesquisador educacional e especialista no ensino de leitura Timothy Shanahan entra para o time de colaboradores do Blog Ciência do Aprendizado, da Escribo. Ele é professor emérito da Universidade de Illinois em Chicago, nos Estados Unidos. Shanahan é ex-diretor de leitura das escolas públicas de Chicago e e fez parte do conselho consultivo do Instituto Nacional de Alfabetização, nos governos de George W. Bush e Barack Obama. É autor e editor de mais de 200 publicações sobre educação em alfabetização, as relações entre leitura e escrita e como ensinar as crianças a ler melhor. Neste artigo, o educador apresenta as Diretrizes de Leitura de Chicago, uma série de competências básicas que devemos estimular nas crianças ao ensiná-las a ler – e o papel do professor nessa relação. Boa leitura!

Pontos principais
Famílias:
com as Diretrizes, as crianças podem aproveitar melhor o tempo para leitura, conhecer diferentes métodos e gêneros textuais enquanto refletem sobre a leitura e os textos que produzem.
Professores: segundo as diretrizes, a alfabetização de uma criança depende do conhecimento das palavras, fluência, compreensão e escrita.
Gestores: a direção pode usar as diretrizes para orientar educadores(as) e gerar resultados melhores no ensino de leitura e escrita.


O Chicago Reading Framework (“Diretrizes de Leitura de Chicago”, em inglês) surgiu do trabalho que fiz nas escolas entre 1999 e 2007. O projeto começou em uma escola de baixa renda do centro da cidade e, oito anos depois, chegou a mais de 200 escolas no estado do Illinois e em cidades espalhadas pelos Estados Unidos. Esse projeto foi tão bem-sucedido e adotado pelas Escolas Públicas de Chicago por dois motivos. Em primeiro lugar, o projeto ajudou muitas escolas a melhorar o desempenho das crianças em leitura, e os resultados desse método – e de metodologias semelhantes em outros lugares – prometiam grandes ganhos acadêmicos para os nossos filhos. Segundo, essa abordagem tenta aproveitar nossos conhecimentos e o que a escola já faz bem. Embora essas diretrizes ofereçam novas abordagens, seu objetivo não era substituir tudo o que já era feito nas escolas, mas vir como um apoio para a continuação do que já funcionava bem no ensino de leitura.Framework na prática

O Chicago Reading Framework parte da premissa de que uma alfabetização escolar eficaz pode sim ensinar a maioria das crianças a ler. Essa premissa não é apenas uma esperança – vários diretores e professores, incluindo alguns em Chicago, já usaram esse modelo para melhorar a leitura em suas escolas. E não estamos falando apenas de aumentar as notas em provas de leitura – pelo menos não diretamente – mas ensinar as crianças a lerem tão bem que isso se reflita na trajetória acadêmica delas. Esse tipo de melhoria ocorre mais facilmente quando damos ênfase ao ensino prático de leitura, em vez de focar no treino para testes e provas. É por isso que a Chicago Reading Initiative (Iniciativa de Leitura de Chicago, em português) investiu tanto na formação contínua de nossos professores.

As diretrizes usam evidências vindas de pesquisas educacionais. As pesquisas nos ajudam a identificar abordagens bem-sucedidas e podem nos dar dados sólidos sobre como implementar iniciativas educacionais para obter resultados positivos. Essa estratégia é alinhada com vários estudos sobre leitura, como o National Reading Panel Report [3], as pesquisas Prevention of Reading Difficulties [4] e Becoming a Nation of Readers (1984), bem como avaliações de escolas locais como as conduzidas pelo Chicago School Research Consortium.

Antes de explicar o que são as diretrizes, vamos definir o que elas não são. Primeiro, não são um programa em si, nem possuem guias e manuais específicos vinculados a elas. Elas também não exigem métodos ou atividades específicas. A pesquisa é clara: muitos programas e materiais educacionais funcionam e não há apenas uma maneira de ensinar a ler. Algumas abordagens provavelmente terão mais sucesso do que outras. Os(as) professores(as) devem confiar no que já sabem para começar a atender às necessidades de leitura das crianças e, com o tempo (e caso necessário), serão orientados a melhorar seus esforços. Enquanto isso, as diretrizes recomendam  focar no que precisa ser ensinado e garantir que as crianças tenham um ensino de qualidade.

Uma tendência natural dos professores e diretores é adiar a implementação até que eles sintam que compreendem as diretrizes. Nesse caso, isso seria um grande erro. Os professores da Escola Pública de Chicago já sabiam e sabem muito. Devemos usar esse conhecimento para ajudar as crianças a se tornarem ótimas leitoras. Vamos melhorar a qualidade do ensino à medida que avançamos.

Horas voltadas ao ensino de leitura

É essencial que as escolas destinem um tempo considerável ao ensino de leitura e escrita. Pesquisas mostram que o professor de nível médio investe em média apenas 55 minutos por dia em leitura e estudos de linguagem, atividades que segundo as evidências podem melhorar muito o desempenho em leitura [1]. Uma pesquisa mostrou claramente que aumentar o tempo que se passa estudando pode melhorar o desempenho em leitura (Rosenshine & Stevens, 1984); no entanto, com exceção do Four-Block Plan (“plano de quatro blocos”, em inglês) [2], que atende às necessidades dos leitores que estão em fase de aprendizado, os conteúdos voltados à formação de professores praticamente não falam sobre o uso do tempo no ensino de leitura. Alguns textos sobre métodos citam sua importância, mas não dizem quase nada sobre o uso do tempo, o que seria ideal, no ensino de leitura. Por isso, resta aos professores descobrir por si próprios quanto tempo investir ou como distribuí-lo entre os vários componentes da leitura. Essas decisões são muito difíceis especialmente para professores dos ensinos fundamental e médio por causa da divisão dos conteúdos em matérias (“disciplinas”).

As diretrizes estabelecem um tempo mínimo de 2h a 3h por dia para o ensino de leitura e escrita e incentivam as escolas a testarem outras abordagens que vão além do horário escolar regular (por exemplo, ler antes ou depois da escola, colônias de férias, envolver os pais, etc). Professores(as) e diretores(as) são orientados(as) a não gastar tempo em tarefas ineficazes para a alfabetização (embora ainda possam usar essas atividades desde que não reduzam a prática de leitura e escrita). Os educadores são livres para experimentar atividades pouco exploradas. A idéia é ensinar os(as) alunos(as) a ler e escrever enquanto garantimos o ensino de matemática, ciências, história, estudos sociais e outras disciplinas. O bom uso do tempo para a alfabetização é ótimo e indispensável.

Os professores podem organizar essas horas de várias maneiras. Em outras palavras: esse ensino não precisa ser blocado em 2h, 3h corridas – embora as escolas possam fazer isso. Montar o horário das aulas é algo complexo e, por isso, o tempo de leitura pode ser distribuído ao longo do dia. Isso significa que as Diretrizes se ajustam aos horários de aula e que os professores podem construir planos que atendam às necessidades e à realidade de seus alunos. O ensino de leitura nas aulas de história, ciências e matemática também conta.

Foco em habilidades essenciais

O ensino de leitura deve enfatizar as habilidades que, segundo as pesquisas, são essenciais para o seu desenvolvimento. As diretrizes organizam essas habilidades em quatro componentes ou categorias básicas de ensino: conhecimento de palavras, fluência, compreensão e escrita. As diretrizes exigem que cada um desses aspectos seja trabalhado igualmente em sala, através de atividades de leitura. Isso quer dizer que professores devem dedicar cerca de um quarto de tempo de ensino a cada uma dessas áreas de desenvolvimento durante um certo período – em até duas semanas. Isso garante que os alunos exercitem esses conhecimentos de forma equilibrada, sem que os professores tenham a criatividade e a flexibilidade restringidas na hora de atender às demandas dos alunos. 

Para serem incluídas como componentes básicos, as habilidades precisavam atender a cinco critérios – com pesquisas ou estudos experimentais que as comprovem. (a) Há pesquisas ou estudos experimentais que avaliam a capacidade de ensino por cada categoria. Por exemplo: estudos deveriam mostrar que o ensino de vocabulário (parte do conhecimento de palavras) levou a um crescimento do mesmo, ou que o ensino de fluência levou a uma leitura mais natural. (b) O estímulo de cada componente levou a uma melhoria geral da leitura, pelo menos para algumas populações. Por isso, os estudos tiveram que mostrar que o trabalho com a escrita levou a melhorias tanto na escrita como no aproveitamento da leitura. (c) As diferentes formas de combinar os quatro componentes, bem como os índices de cada um desses componentes, deveriam se relacionar de forma positiva e significativa com outros componentes e com os resultados gerais da leitura. (d) Cada categoria precisava ser independente. Aqui, estão incluídos estudos de caso de indivíduos precoces, com dificuldades de aprendizagem ou com lesões cerebrais que tiveram ganhos em um componente e desenvolvimento desproporcional nos outros, ou que obtiveram ganhos em três dos componentes sem progresso equivalente no quarto. (e) Finalmente, cada categoria precisava ter diferentes curvas de crescimento. Juntos, os componentes sugerem que conhecimento das palavras, fluência, compreensão e escrita estão relacionados, ainda que separáveis, ao aprendizado na alfabetização, que podem ser ensinados e, na prática, provavelmente levarão a ganhos na leitura.

Recentemente, o National Reading Panel (Painel Nacional de Leitura, em português) passou a informar ao Congresso dos EUA sobre os reflexos das pesquisas sobre o ensino de leitura. Enquanto pesquisas já apontavam o estímulo à escrita como eficaz [5], o relatório do Painel constatou que o ensino de conhecimento de palavras (incluindo fonética, consciência fonêmica e significado das palavras), fluência e compreensão gerava resultados muito positivos no aprendizado de leitura na educação infantil e no ensino fundamental.

A categoria conhecimento das palavras inclui o ensino de vocabulário, consciência fonêmica, fonética, ortografia e os significados das palavras. Outra categoria, fluência, enfatiza a velocidade, precisão e expressão na leitura de sentenças e textos. A compreensão está ligada ao entendimento do texto, enfatizando a leitura literária e de conteúdo (ciências, história, etc.). A escrita é o componente final, na qual os alunos aprendem a compor seus próprios textos de maneira eficaz para diversos objetivos. Essas quatro categorias são igualmente importantes nos vários níveis de escolaridade, mas a ênfase nas categorias muda um pouco ao longo do tempo. Por exemplo: o ensino de palavras na infância se concentra nas consciências fonêmica, fonética e no vocabulário mas, à medida que as crianças aprendem essas habilidades, a ênfase muda para o estudo do significado das palavras. Em outro exemplo, no começo as aulas podem enfatizar mais a leitura ou a escrita literária (narrativa) como parte do estímulo das habilidades de compreensão ou composição, mas essa ênfase muda para o estudo e composição de textos de conteúdo expositivo ou explicativo à medida que os alunos envelhecem.

Conhecimento das palavras

O conhecimento das palavras inclui o ensino tanto do reconhecimento quanto do significado das palavras. Na educação infantil até o terceiro ano do fundamental, é indispensável que os professores separem muito tempo para ensinar as crianças a reconhecer as palavras. O estímulo à consciência fonêmica (ensinar as crianças a ouvir e manipular os sons separáveis ​​em partes) deve fazer parte da alfabetização já no início da educação infantil. A maioria das crianças se beneficia de aproximadamente 20 horas de ensino sobre consciência fonêmica (cerca de 15 minutos por dia durante um semestre), mas esse ensino deve continuar até que os alunos consigam segmentar completamente palavras simples (como dividir a palavra gato em sons separados: /g/, /a/, /t/, /o/).

Começando na educação infantil, o ensino fônico deve ser incluso em atividades diárias. Esse ensino deve permitir que as crianças aprendam os nomes e sons das letras; aprendam a ler muitos dos padrões comuns de ortografia no idioma (como os sufixos -ando/endo/indo, -ação e -mente, por exemplo); e a usar essas informações para soletrar ou descobrir novas palavras (isso significa que a prática de leitura deve fazer parte do ensino fônico).

Durante esses primeiros anos, também deve haver ênfase no ensino do vocabulário visual das crianças – ou seja, palavras que elas possam reconhecer imediatamente. Palavras usadas com frequência como de, foi, com, viu, ali, para, por e assim por diante precisam ser aprendidas com muita proficiência. Os professores podem usar listas de palavras para se orientar neste momento. O objetivo é ensinar as crianças a reconhecerem as palavras listadas com rapidez e precisão.

Após cerca de três anos de ensino fônico e de vocabulário visual, os professores deveriam mudar o foco para o vocabulário ou para o significado das palavras. Como no ensino de fonética e consciência fonêmica, uma ampla variedade de métodos ou materiais pode ser usada com sucesso. Os melhores métodos de ensino exigem que os alunos usem o vocabulário de várias maneiras (conversando, ouvindo, lendo, escrevendo) e exigem que os alunos analisem e explorem definições das palavras e como podem se relacionar umas com as outras. Além disso, também é preciso se incluir na programação muitas atividades de revisão textual.

O ensino de ortografia também é parte importante do ensino de palavras. Tais atividades devem ajudar os alunos a acertar a grafia das palavras e pode proporcioná-los a chance de refletir sobre como as palavras são estruturadas. Esse ensino deve ser rápido e feito em conjunto com o ensino de fonética e de reconhecimento de palavras.

Fluência

Esse termo se refere à capacidade de uma pessoa ler um texto com velocidade, precisão e expressão satisfatórias. Embora a fluência esteja ligada tanto à leitura silenciosa quanto à falada, as diretrizes sugerem que o ensino da leitura falada é mais eficaz para o desenvolvimento dessa habilidade nos alunos. Atividades como leitura em dupla/grupos ou assistida foram eficazes já na educação infantil até os anos entre o fundamental e o médio. Nessas tarefas, os alunos se revezam na leitura de partes de um texto em voz alta, dando feedback um ao outro e relendo o texto várias vezes até que seja bem executado.

Se um aluno apresenta melhorias na fluência, o professor tem duas opções. Primeiro, se o texto se encaixar no exercício da leitura, o professor precisa apenas monitorar o desempenho da criança, ouvindo-a, para então diminuir o tempo destinado ao ensino de fluência (esse componente é o único da estrutura que pode ter esse tempo reduzido – e isso só pode ser feito se os alunos estiverem em um nível aceitável de fluência). Segundo, se o professor acha que a criança deve consumir materiais mais difíceis, pode aumentar o nível de dificuldade dos textos inclusive de conteúdos como estudos sociais ou ciências.

Os alunos fluentes geralmente podem ler um texto com apenas um erro de leitura a cada 100 palavras, em média, e ler com suavidade e rapidez. As crianças pequenas (até o segundo ano) devem procurar ler um texto de 60 a 80 palavras por minuto), enquanto que para crianças mais velhas a leitura deve aumentar para 100 palavras por minuto. A pontuação e as pausas precisam ser respeitadas para que o texto se pareça com uma conversa natural.

Compreensão de leitura

Os alunos precisam ser ensinados a entender o texto de forma independente. O ensino de compreensão inclui três componentes. Primeiro, ensinamos as crianças a buscar informações específicas. Segundo, mostramos como os textos são organizados e como elas podem usar essas estruturas para lembrar das informações dispostas mais facilmente. Terceiro, ensinamos uma variedade de estratégias ou ações que as crianças podem adotar antes, durante ou depois da leitura para melhorar sua compreensão e o aprendizado.

Para crianças pequenas, o ato de aprender quais informações devem ser priorizadas durante a leitura pode estar ligado, por exemplo, ao conhecimento de que bons leitores se concentram nas informações que o autor diz de maneira explícita, que devem ser deduzidas e baseadas no conhecimento prévio ou nas informações que você traz para um texto. À medida que as crianças crescem e as demandas de leitura se tornam mais desafiadoras e disciplinares, o ensino precisa mostrar a elas que tipo de informação procurar quando estão lendo conteúdos como textos de História, Ciências, Matemática ou Literatura.

A estrutura dos textos varia muito entre os gêneros narrativo e expositivo, e os alunos precisam de experiência e orientação para lidar com ambos. Para ler narrativas, as crianças precisam aprender sobre a estrutura da trama (incluindo personagens, problemas, soluções, resultados, etc.). Conhecer as “partes” de uma história ajuda as crianças a identificar informações importantes e depois se lembrar da história. Da mesma forma, os alunos precisam conhecer as diferentes partes dos textos expositivos (como solução de problemas, causa-efeito, comparação-contraste), sabendo inclusive que tipos específicos de informações serão fornecidos em certos textos. Por exemplo, livros de estudos sociais geralmente trazem informações sobre geografia, economia, cultura e história. Os alunos podem usar essas informações para pensar de maneira mais eficaz sobre como o autor apresenta a cultura ou época em questão.

As crianças também podem utilizar uma série de técnicas que estimulam a reflexão sobre textos de maneira mais eficaz. Ensinar os alunos a monitorar a própria leitura (para ter certeza de que estão entendendo e pedir ajuda quando não estão), questionar, resumir e reescrever o texto são apenas algumas dessas técnicas.

Por fim, vamos lembrar que os alunos se beneficiam do estímulo à compreensão – não apenas da prática. Muitos professores passam tarefas de leitura no estilo perguntas e respostas, mas isso não é o suficiente. As crianças precisam ser efetivamente ensinadas a compreender.

Escrita

As crianças precisam ser capazes de escrever seus próprios textos e de ler o que as outras escreveram. A leitura e a escrita dependem praticamente da mesma informação (incluindo gramática e ortografia, coesão e coerência, vocabulário, etc.), e aprender a ler e escrever simultaneamente pode dar uma vantagem às crianças. A escrita deve ensinar as crianças a escrever para uma variedade de propósitos e públicos, usando estratégias e ações que lhes permitam resolver vários problemas. A produção das crianças devem ter conteúdos significativos e eficazes.

Elas precisam saber como recontar eventos (escrita narrativa), explicar e analisar informações (exposição) e desenvolver a argumentação (persuasão), e o nosso ensino deve mostrá-las como fazer isso de maneira eficaz. Também precisam aprender a adaptar o tom e o assunto às necessidades dos leitores; aprender a escrever para si mesmas (notas, lembretes); para outras pessoas que compartilham informações com elas, e para audiências de diferentes faixas etárias e níveis de conhecimento (como escrever uma publicação, por exemplo). Os alunos devem aprender a produzir textos elaborados, focados em um único tema, organizados e que utilizem da maneira correta a gramática, a ortografia e diferentes estruturas. Precisam dispor de uma série de técnicas que os ajudem a se preparar para escrever, revisar e editar o que escreveram.

A Chicago Reading Initiative forneceu formação para professores e diretores nas quatro áreas. No entanto, essa formação leva tempo. Os professores podem começar a ensinar as quatro áreas usando seus conhecimentos e experiências atuais e podem aprimorar esses esforços por si mesmo e pelas oportunidades oferecidas a eles.

Às vezes, me perguntam por que alguma prática não está incluída neste sistema: pode ser o ensino gramatical formal, transição entre idiomas para estudantes bilíngues, tempo livre de leitura, conteúdos voltados aos professores e assim por diante. A razão é que nenhuma pesquisa provou que essas práticas trazem melhorias ao desempenho de crianças em todas as faixas etárias. No entanto, essas atividades ainda podem ser usadas ​​nas salas de aula de Chicago, mas não podem ser contabilizadas nas duas horas destinadas para leitura.

Continuidade

Um ensino de leitura poderoso vai longe. Ele estimula um aprendizado de qualidade, crescente entre diferentes anos, idades, séries e escolas – e faz isso mesmo com todas as propostas pedagógicas oferecidas pelas escolas (educação especial, educação infantil, ensino fundamental, ensino integral, etc.). As Diretrizes de Leitura de Chicago devem funcionar como um elo entre professores de todos os níveis de ensino e de todos os aspectos de um programa educacional da escola ou do município. Todos os professores, não apenas os que trabalham a questão da leitura, precisam ensinar usando as Diretrizes. Qualquer profissional das Escolas Públicas de Chicago cujo ensino exija materiais ou textos escritos precisa adotar essas medidas.

Já é tradição concentrar os esforços do ensino de leitura em níveis específicos, como no infantil ou no ensino fundamental. A acumulação de recursos nesses pontos provavelmente não é a melhor maneira de criar programas eficazes para as crianças. Precisamos maximizar nossos esforços em todo o sistema, uma vez que o desenvolvimento da leitura é essencial para o sucesso dos alunos em áreas acadêmicas como ciências, história e matemática, bem como para sua participação futura na sociedade. As Diretrizes tratam todos os níveis de ensino como importantes para o desenvolvimento dos alunos.

As escolas podem garantir essa continuidade por muitas maneiras. Por exemplo, a direção pode adquirir materiais educativos que ajudem os educadores a cumprir os programas pedagógicos com consistência. No entanto, esses materiais são apenas uma alternativa: essa continuidade pode ser alcançada por meio de professores que cheguem a um conjunto de acordos sociais ou objetivos curriculares específicos, incluindo uma indicação clara de quais séries serão responsáveis ​​por cada conteúdo. Os diretores e as faculdades são incentivados a se envolverem no planejamento e na tomada de decisões que garantirão maior continuidade nos níveis de ensino. Com o tempo, teremos mais conhecimentos nessa área, com base nos esforços das nossas escolas mais bem-sucedidas. Em outras palavras, lutamos por maior continuidade e consistência no futuro, mas não faremos isso por meio de ações arbitrárias.

Avaliação

Outra maneira de garantir programas de leitura eficazes é criar uma avaliação adequada. Não estou falando de testes formais como o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), esses testes têm seu lugar mas não são indicados para melhorar o ensino no dia a dia. Professores e diretores devem estar cientes do quão bem as crianças estão aprendendo com esse ensino, para que possam fazer os ajustes necessários ao longo do caminho.

Se um professor está ensinando o vocabulário visual, ele precisa saber se as crianças estão aprendendo as palavras ensinadas. Esse conhecimento permitirá que o professor diminua ou acelere a parte prática. Da mesma forma, um professor precisa de instrumentos para monitorar se as crianças estão progredindo em fluência, em compreensão ou se a escrita delas está melhorando. Muitos professores já coletam essas informações sobre as crianças e já conseguem dar retornos às famílias e implementar melhorias no cotidiano. Os diretores também precisam ter acesso a esse tipo de informação para apoiar melhor os esforços de seus professores.

A Chicago Reading Initiative eventualmente fornece às escolas um apoio aprimorado para a avaliação contínua nos quatro componentes básicos, para ajudar os professores a melhorar e as crianças a monitorarem o próprio desempenho. Dessa forma, podemos focar os recursos onde eles são necessários e aumentar a eficácia do ensino para todas as crianças.

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Conclusões

Nos últimos 40 anos, pesquisas educacionais vêm crescendo e demandando cada vez mais tempo, maior foco nos fundamentos da aprendizagem, maior continuidade e maior conscientização sobre o progresso das crianças. As diretrizes tentam resolver cada uma dessas preocupações e, com o tempo, pudemos dar assistência a todos os professores. Embora as pesquisas foquem no ensino dos quatro componentes básicos – palavras, fluência, compreensão e redação – cada um deles poderia ser discutido apenas usando o senso comum. E ainda assim, em muitas escolas e salas de aula, conhecimentos que são básicos são ignorados.

As crianças que têm dificuldades tendem a receber menos atenção do que as mais bem-sucedidas. Da mesma forma, é menos provável que recebam um ensino equilibrado que aborda todas essas áreas importantes e provavelmente haverá menos apoios à continuidade e à avaliação contínua. Nessas escolas, frequentemente os representantes políticos desejam impor uma solução no estilo “bala mágica” (que resolva todo problema) aos professores. No entanto, as pesquisas são claras: não existe uma bala mágica. As escolas precisam, sim, é de um bom ensino e boa supervisão. É essencial garantir essas condições em todas as escolas públicas de Chicago. O ensino envolvente, inteligente e de alta qualidade continua sendo a melhor solução para nossos problemas de leitura, e as Diretrizes de Leitura de Chicago devem ajudar a orientar esse ensino para as necessidades de nossos filhos. Do presente aos próximos anos, teremos recursos para utilizar as diretrizes com mais eficiência. No entanto, até que esse apoio esteja disponível, não há razão para não fornecer às crianças um ensino de qualidade dedicado a esses componentes básicos do desenvolvimento. Nós sabemos o que fazer. A hora é agora.

Referências

[1] Baumann, J., and Hoffman, J. (1999.) The first r revisited: A national survey of educational practices. Reading Research Quarterly.

[2] Cunningham, P. M. (1991). Multimethod, multilevel literacy instruction in first grade. Language Arts, 68, 578–584.

[3] National Reading Panel. (2000). The report of the National Reading Panel. Washington, DC: National Institute of Child Health and Development. (2000). 

[4] National Assessment of Educational Progress. (1999). NAEP 1998 Reading Report Card. Washington, DC: National Center for Education Statistics.

[5] Tierney, R., and Shanahan, T. (1991). Reading-writing relationships: Proc­esses, transac­tions, out­ comes. In P. D. Pearson, R. Barr, M. Kamil, and P. Mosenthal (Eds.), Hand­book of Reading Research (vol 2., pp. 246-280). New York: Longman.