Nas últimas duas semanas, recebi várias perguntas sobre aprendizado à distância e ensino remoto. Aqui está um exemplo de questão, enviada por um professor: “Pode ser que eu não dê aulas presenciais aos meus alunos durante todo este ano. Qualquer ajuda que você puder fornecer será muito bem vinda.”
Para responder a essa pergunta, vamos imaginar que você foi designado para ajudar a melhorar o aprendizado em leitura em uma escola local. Você começa fazendo observações em sala de aula para ver se consegue descobrir o que poderia ser melhorado e fazer a diferença.
Há muitas coisas que você pode procurar, pesquisar. Eu vou focar no básico: quantas informações e atividades de leitura as crianças estão recebendo? Elas estão aprendendo e desenvolvendo todas as habilidades essenciais? Elas estão lendo e interagindo com o professor e com outras crianças sobre o que estão lendo? Em muitas salas de aula, todas as crianças são atendidas ao mesmo tempo pelo(a) professor(a), com poucas chances de receber respostas personalizadas e que atendam às suas necessidades individuais. Ou ocorre o contrário: divididas em grupos pequenos, passam muito tempo sozinhas.
Todo o tempo de aula pode ser eficaz se as crianças participam muito e se o professor acompanha, media e responde às suas necessidades; infelizmente, isso não acontece frequentemente. O tempo do pequeno grupo também pode ser eficaz, mas geralmente isso não ocorre em função do que está acontecendo com o resto das crianças na sala de aula. Veja o que as evidências dizem sobre tarefas de classe e outras atividades de aprendizagem individual. Eles podem manter as crianças ocupadas, mas isso não se quer dizer que elas estão aprendendo.
As crianças ficam mais “inibidas” nas aulas online?
Recentemente, eu estava conversando com uma professora do ensino médio que me contou sobre suas experiências de ensino a distância no primeiro semestre de 2020. “Eu conhecia meus alunos muito bem antes do distanciamento social. Fiquei surpresa com a forma como eles participaram das aulas online. Os alunos que eu sabia que podiam dar ótimas respostas, nos momentos de troca, estavam muito silenciosos e participaram bem menos. Em vez de dar respostas robustas que ajudariam as outras crianças, eles estavam dando respostas de uma ou duas palavras.”
Analisei artigos e pesquisas para ver se achava informações sobre essa suposta inibição do aluno – mas não tive sucesso. Dessa forma, comecei a perguntar a outros professores sobre isso para ver como foram suas experiências durante o distanciamento social. Vários me disseram que também notaram esse problema. Seus alunos estavam mais quietos, menos participativos, aparentemente mais reticentes.
Esse tipo de inibição ou timidez que esses professores descreveram é um problema real. Estudos mostram a importância da discussão e de outros tipos de interação professor-aluno e aluno-aluno na aprendizagem (por exemplo, Matumara, Garnier, & Spybrook, 2013; Ponitz, Rimm-Kaufman, Grimm, & Kirby, 2009; Barnes & Puccioni, 2017). Se um professor faz uma pergunta e os alunos ficam se entreolhando ou olham para cima sem responder, provavelmente aprenderão bem menos.
Crie enquetes para despertar o interesse pela leitura guiada
Aqui está o meu conselho: aprenda a usar o recurso de votação de sua plataforma de ensino e crie enquetes. A enquete pode ser um pouco complicada, mas permite que cada aluno se posicione individualmente. Isso é mais seguro em termos de respostas dos alunos do que um professor normalmente pode obter durante uma aula em um pequeno grupo, e o professor pode monitorar/acompanhar essas respostas. “Tiago, vejo que você ainda não respondeu.”
Para a enquete, pense em perguntas mais variadas do que você faria normalmente. Professores costumam dar aos alunos um propósito para a leitura: “Neste texto, procure descobrir por que Tiago não queria ir para o acampamento.” Mas o professor normalmente não acompanha essa informação com uma pergunta. Talvez, em vez de ir direto para a leitura, seja mais interessante fazer uma enquete com as crianças com uma pergunta de múltipla escolha.
Qual destes é o nosso propósito ao ler esta parte da história?
- Descobrir onde Tiago vai passar as férias;
- Descobrir se Tiago vai para o acampamento;
- Descobrir por que Tiago não quer ir para o acampamento;
- Descobrir por que Tiago quer ir para o acampamento.
Eu faria isso para manter o foco das crianças no jogo. Essa abordagem já não é necessária quando estamos todos presencialmente ou sentados ao redor de uma mesa. Mas, à distância, precisamos ser bastante vigilantes quanto à participação das crianças. Essas atividades em sala ensinam aos alunos mas incentivam pouco que eles se envolvam na aula. Em aulas online, é importante envolver a criança ao mesmo tempo em que informa, e eu acredito que a enquete pode ajudar nisso.
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Peça para as crianças fazerem uma leitura guiada em silêncio
Outra possibilidade seria não dizer às crianças o propósito, mas reformular a pergunta da seguinte forma: “Qual destas seria a melhor coisa para se procurar quando lermos a próxima seção?” Essa proposta é menos sobre verificação e mais sobre como fazer com que as crianças se engajem bastante na realização da atividade, porém pode funcionar de ambas as formas.
Para esse tipo de leitura guiada, peça aos alunos que leiam o texto silenciosamente, exceto as crianças mais novas que talvez ainda não saibam fazer isso. Quando os alunos conseguirem ler com mais desenvoltura, entre o 1º e 2º Ano do Ensino Fundamental, eles já devem pelo menos ser capazes de fazer a leitura sussurrada ou murmurada, mesmo que não totalmente em silêncio, no começo e certamente não precisam pronunciar todas as palavras em voz alta.
As evidências revelam que os professores dependem demais da leitura feita em voz alta, aluno por aluno, quando utilizam textos em grupo. O ensino à distância tende a reforçar ainda mais esse tipo de estratégia. Resista a isso, pois as crianças precisam aprender a ler silenciosamente para compreender, mesmo que isso signifique ler algo mais de uma vez para entender.
Para essa leitura silenciosa, divida o texto a ser lido em pequenas partes. Se você estiver enviando livros para casa, sugiro aumentar o número de “paradas” que você normalmente faria em uma atividade de leitura em grupo. Se você comumente pede às crianças que leiam toda a seleção por conta própria, peça que leiam apenas 3-4 dessa proposta antes da discussão. Se costuma entregar algumas páginas, então proponha uma ou duas pois, quanto mais curtas as leituras, menor o tempo que as crianças levarão para ler tudo. No ensino à distância, é preciso manter o grupo mais unido do que o normal.
Quando os livros não são enviados para casa, os alunos devem ler o texto projetado no quadro ou tela. Isso certamente limita a duração das leituras, mas os professores podem facilmente acompanhar esses intervalos de leitura silenciosa com discussão.
A chave do sucesso da leitura guiada: diversificar!
Embora eu recomende a pesquisa de opinião, não se limite às respostas coletadas. A enquete é útil; no entanto, não substitui uma discussão real. Essa estratégia pode ser utilizada para identificar as crianças que não estão prestando atenção, pode ser um ponto de partida para uma discussão real ou uma ferramenta de diagnóstico para descobrir quem não está compreendendo o assunto. Faça a devolutiva da enquete da seguinte forma: “Há algumas divergências aqui. Alguns de vocês disseram sim e alguns disseram não. Leiam o texto novamente e vejam como encontrar evidências para apoiar suas ideias. ” Ou “Alguns de vocês perderam este item. Vamos voltar a esse parágrafo e ver se podemos descobrir … Alguém quer mudar sua resposta? ”
Faça enquetes com os alunos não apenas sobre os tipos de perguntas que você tradicionalmente faz – como aquelas que você faz seguindo o padrão expresso no livro didático.
Examine o texto com antecedência e observe as situações que você acha que podem confundir as crianças: uma frase complicada, uma informação dada de forma sutil, um ponto-chave facilmente esquecido, uma conclusão necessária, uma definição que pode ser alcançada por meio do contexto, figuras de linguagem ou uma expressão idiomática, uma estrutura de texto informativa e reveladora. Só então você faz perguntas que revelarão se os alunos compreenderam ou se eles precisam de alguma orientação específica.
A quantidade e a qualidade da interação afetam o quanto os alunos aprendem. Se você está trabalhando em uma situação que não encoraja a interação, ajuste seu ensino e aproveite as vantagens da tecnologia para tentar impulsioná-las. A enquete é uma daquelas estratégias que podem tornar eficaz uma aula de leitura guiada ministrada à distância.
Texto original disponível aqui.
Timothy Shanahan é professor emérito da Universidade de Illinois em Chicago, nos Estados Unidos, onde foi diretor fundador do UIC Center for Literacy. É ex-diretor de leitura das escolas públicas de Chicago. Foi membro do Conselho Consultivo do Instituto Nacional de Alfabetização, sob os presidentes George W. Bush e Barack Obama. É autor/editor de mais de 200 publicações sobre educação em alfabetização, com ênfase nas conexões entre leitura e escrita, alfabetização em disciplinas e melhoria no desempenho da leitura.
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