Apesar de aparecer no topo dos rankings educacionais internacionais, como o Programme for International Student Assessment (PISA), o sistema educacional da China vem sendo questionado, nos últimos anos, por pesquisadores ao redor do mundo.
Mas por que uma educação que garante resultados está sendo questionada?
Ainda que vários estudantes tenham alto desempenho educacional até mesmo nas áreas rurais e mais pobres, uma coisa chamou atenção dos especialistas: o stress era comum à todas essas crianças.
Vários fatores agravam esse quadro:
- Estudantes chineses passam mais tempo na sala de aula do que a maioria dos estudantes ao redor do mundo, como os britânicos, por exemplo.
- Os dias de aula são maiores até em escolas primárias, onde as crianças ficam na escola de 8h às 15 h, com um intervalo de apenas meia hora para almoço nas grandes cidades como Shanghai e Beijing.
- Os feriados são diminuídos para que elas tenham mais dias de aula.
- Em média, no sistema chinês de educação, os anos letivos costumam ter 245 dias e 175 dias sem aula – 37 dias a menos do que a maioria dos estudantes ao redor do mundo, como no Reino Unido, onde as crianças têm 212 dias de descanso, incluindo férias e feriados.
A rotina escolar fica ainda mais puxada quando as crianças passam para o ensino fundamental, onde a competição para entrar nas melhores escolas de ensino médio (conhecidas como high schools) aumenta a pressão: enquanto os pais investem em aulas de inglês e olimpíadas de matemática, o tempo de aula aumenta paralelamente – os estudantes do ensino fundamental chegam a escola às 7:30h e saem às 16h.
Além disso, 45% das crianças ainda ficam mais 4h na escola para aulas extras de reforço após as aulas – sem falar das tarefas de casa e trabalhos extra classe, quando elas finalmente voltam para casa à noite.
Essa rotina é enaltecida pelos pais, que reconhecem a educação como o mais importante caminho para o sucesso na cultura chinesa. Segundo os próprios estudantes, a influência dos pais, que cultivam altas expectativas em seus filhos de forma que possam realizar neles seus próprios sonhos, é o principal agente motivador dos pupilos chineses.
Em tempo, pesquisadores do Reino Unido e da China acreditam que não existem vantagens em passar tantas horas na sala de aula além de bons resultados em rankings e conhecimento focado apenas em absorver conteúdo.
Faltam habilidades básicas para o século XXI nos estudantes do país asiático, como relacionamentos interpessoais bem desenvolvidos, resolução de problemas e criatividade. Vale a pena uma educação que garante resultados em rankings e testes se ela não estimula a curiosidade, a produção criativa e as habilidades motoras das crianças?
Uma pesquisa do Comitê Científico do Núcleo Ciência Pela Infância (que conta com a USP e a Universidade de Harvard) sobre desenvolvimento infantil afirma que a criança precisa brincar para fazer as sinapses necessárias para um crescimento saudável, garantindo vivências e experiências que garantem um pensamento rápido e resolução de problemas, o que pode ser levado para o futuro:
“Um importante aspecto da experiência do desenvolvimento infantil, do ponto de vista da criança, são as habilidades que ela adquire ao brincar, seja com objetos ou com pessoas. Por intermédio do brincar, já desde os primeiros meses de vida, a criança aprende a explorar sensorialmente diferentes objetos, a reagir aos estímulos lúdicos propostos pelas pessoas com quem se relaciona, e a exercitar com prazer funcional suas habilidades.”
Outro estudo realizado pela Ian Morgan of Australian National University afirma que, devido às longas horas de estudo dentro de sala de aula e poucas horas expostas ao sol do lado de fora, 90% das crianças e jovens asiáticos (incluindo China, Japão e Singapura) estão com altos graus de miopia.
Ou seja, brincar é coisa séria e a educação não pode negligenciar isso.
Américo é doutor em educação pela Johns Hopkins University. Pesquisador em educação, fundou a Escribo onde trabalha com as escolas para fortalecer o aprendizado das crianças.
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